Quero começar elogiando o texto do Zé Dirceu sobre “Desserviço
que o preconceito impõe a democracia”.
Nele, José Dirceu explica corretamente:
“Não podemos ficar na defensiva e no recuo frente à violência e à
chantagem de certos setores evangélicos que querem interditar o debate sobre
esses temas no país e patrulhar todas as políticas públicas com relação às
questões do aborto e da homossexualidade. Esses grupos buscam impor ao Estado
brasileiro uma visão preconceituosa e repressiva. Os que dão guarida a esse
comportamento violento que introduz em nossa sociedade o ovo da serpente do
preconceito e do racismo prestam um desserviço à democracia e à convivência
social”.
Se isso é verdade, como é que o Zé Dirceu continua defendendo as alianças que o PT faz a torto e a direito, incluindo ai a nomeação de um ministro, Marcelo Crivella do PRB (Ministro da Pesca) que teve o desplante de declarar a respeito do tema pertinente ao seu ministério “não sei colocar uma minhoca no anzol”? Ministro que foi nomeado apenas para manter o “diálogo” com a bancada evangélica no Congresso, diálogo que estava “rompido” exatamente por ter outro ministro (Gilberto Carvalho) feito em reunião pública um comentário parecido com o do Zé Dirceu?
O
problema é José Dirceu se declara um “aliancista” e acaba entrando em
contradições para defender esta política do PT, política cuja única coerência é
o abandono do socialismo e a defesa da burguesia, que tem como princípio manter
os lucros abertos do capital em nome do “nosso projeto” que a esta altura do
campeonato está, para dizer o mínimo, muito distante (se por “nosso projeto”
entendermos o socialismo).
No
artigo em que se declara “aliancista” 'A aliança com o PMDB não é pouca coisa' - Zé Dirceu explica:
“Todo mundo sabe que sou o que muitos chamam de aliancista. Sempre
defendi a prioridade na aliança com o PMDB, partido fundamental para a
governabilidade. Mas trazer a questão da eleição de São Paulo e do pleito
municipal à baila quando se discute a relação com o governo federal não faz
sentido”.
Ora
essa, que diabo de aliança é essa (com perdão aos evangélicos, que também têm
direito à aliança e ministro nacional) em que no governo federal é uma coisa e
nos pleitos municipais é outra coisa? Na verdade, a coisa não é bem assim, o Zé
Dirceu sabe bem disso e ele próprio trata de se corrigir, quase que como uma
ameaça para o PMDB:
“Agora, em nível nacional, o PT está em 118 cidades, incluindo capitais
e cidades de mais de 150 mil habitantes. Nesse âmbito, o PT já apoia o PMDB em
quatro cidades e pode apoiar em oito.”
Ou
seja, o PMDB trate de ficar quieto senão o PT pode não apoiá-lo nas oito
cidades e talvez retirar o apoio nas outras quatro. Belo modo de fazer
política, tão Brasil! E Zé Dirceu explica como estão estes apoios e em que
locais:
“Nas
últimas eleições tivemos quase o mesmo tanto de votos que o PMDB nos
municípios. O PMDB elege prefeituras em maior número, em pequenas cidades. Já,
nos Estados, o PMDB tem uma posição superior à do PT nos governos estaduais,
começando pelo Rio de Janeiro e por São Paulo, onde o partido é aliado do PSDB.
Assim, parte da bancada do PMDB pode ter outras razões e motivos para o
manifesto divulgado ontem, que não as eleições municipais. Vale lembrar,
também, nas eleições de 2010, quando o PMDB indicou Michel Temer para vice de
Dilma Rousseff, que no Amazonas, Mato Grosso, Rio de Janeiro e Maranhão
estivemos juntos nas vitórias nesses Estados. Apoiamos, ainda, o PMDB em Minas
Gerais e Tocantins. Trabalhamos em conjunto, também, no Paraná, Espírito Santo,
Ceará, Paraíba e Alagoas”.
Os
exemplos do Zé são tocantes. Maranhão, aonde o PT quase foi destroçado, com
militantes históricos que construíram o partido, como Manoel da Conceição que
fez greve de fome contra o acordo aliancista com os ‘Sarneys’, gente da mesma
laia dos oligarcas que destroçaram sua perna e mataram milhares de seus
companheiros de luta.
No Rio de Janeiro, com um governador que
se destaca pela violência policial e onde, recentemente, um cabo PM foi preso
antes de uma greve por manifestar opinião favorável a ela, onde os manifestantes
contra o aumento do preço da tarifa de transporte nas barcas foram indiciados
na polícia antes da manifestação, por terem convocado a manifestação! Belos
exemplos de democracia que o Zé nos apresenta para defender!
No
Rio, sem que tenhamos nenhuma solidariedade com o ex-governador e atual deputado
Garotinho, alias, diga-se de passagem, um dos integrantes da “base aliada”,
tanto ele como a deputada Janira, do PSOL, foram alvo de escutas telefônicas
onde até hoje não se mostrou nem a decisão judicial que permitiu tais escutas
nem a integra das gravações. Onde no inquérito contra o cabo que foi preso, a
solicitação de ouvir a totalidade das gravações foi negada pela corte policial!
Sim, um belo exemplo de falta de democracia. Chega a beirar a ditadura!
Assim,
meu caro José Dirceu, beira demais a hipocrisia você defender em vários artigos (ver os links artigo 1, 2 e 3) a Comissão da Verdade,
defesa mais que justa e, ao mesmo tempo, defender um governo como o do Sr.
Cabral que adota métodos policiais e investigativos que cheiram demais a
ditadura. Presos por delito de opinião? Inquérito policial para quem chama
manifestação contra aumento de preços do transporte? Prender
administrativamente todos os grevistas do serviço de salva-vidas? Este é nosso
“aliado” democrático?
Mas,
José Dirceu, não contente com suas contradições, explica no último parágrafo
como o PMDB deve se comportar, o cinismo fala por si:
“Como
vemos a aliança PT-PMDB não é pouca coisa. Então, vamos deixar os municípios em
paz e discutir o que interessa ao PMDB: suas relações com o governo federal.”
(grifo nosso).
Ou
seja, o que interessa mesmo são os cargos e as verbas que o PMDB terá ‘direito’
a manejar.
Mais
cínico e mais antitrabalhador, impossível!
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